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Dia de celebração religiosa afroalagoana no mar de Iemanjá
REPETINDO O TEMA, como sempre, nas proximidades do 8 de dezembro, insisto na importância particular da data para a cultura alagoana no geral e para a temática afrodescendente no particular. Desde que me entendo por gente – como se dizia no meu tempo de menino, e já se vão seis décadas nessa toada –, oito de dezembro é dia de festa no mar. É o momento em que a macumba, o xangô, ou denominações respeitosas outras, deixa seus terreiros e ganha as praias com muita gente em celebração. Em plenitude. É uma data-raiz de Alagoas, merecedora de ser oficializada como patrimônio imaterial.
É UM MOMENTO DO SAGRADO, celebração religiosa de pura raiz afrobrasileira. Não é mera festa de rua, tipo carnaval fora de época. O tributo à Iemanjá tem o mesmo caráter devocional das procissões por Nossa Senhora da Conceição, referência católica para a mesma data, como sabemos. A diferença principal – além das teologias, etnologias, e considerações sobre classes sociais –, é que os cultos afrobrasileiros em Alagoas passaram por terríveis ondas de perseguições, dentre as quais se destaca o sinistro Quebra, cujo ápice se dá em 1912, e que marca profundamente o cenário afro religioso local com o abafamento dos terreiros. Isto resultou na ação defensiva do Xangô rezado baixo – uma semiclandestinidade, um escondimento visando a sobrevivência. Por mais de um século, a única manifestação pública, ampla, foi o 8 de dezembro.
HOJE, sem ser mais a única, é o 8 de dezembro a maior e mais esfuziante das aparições públicas da religiosidade de matriz africana em Alagoas. Traz esse acontecimento, a cada ano – em sua exuberância de cores, tambores, danças, cortejos e oferendas –, a memória da resistência, da irresignação dos cultos afrobrasileiros frente à discriminação. Os poderes públicos, da mesma forma e com o mesmo cuidado com que apoia e aloca verbas em prol dos cultos cristãos, precisam apoiar e disponibilizar meios para que o Dia de Iemanjá se mantenha como momento soberano das religiões afrobrasileiras em nosso Estado.
SOSO DE YEMONJÁ, liderança feminina na Casa Posú Betá, informa que, no domingo, dia 7, o terreiro da decana das mães de santo de Alagoas, Mãe Mirian (91 anos), comemora 75 anos de celebrações do 8 de dezembro: “Desde que, em 1950, o terreiro de Pai Edinho de Xangô, esposo (já falecido) de Mãe Mirian, no Corredor da Ponta da Terra (Rua Itambé), fez o primeiro presente público de Posú Betá para Yemonjá, não houve interrupção”. Soso complementa que, no evento dominical, o desembargador Tutmés Airan receberá o título honorífico de Obá de Xangô por sua trajetória de solidariedade ao povo de terreiro e de defesa dos valores culturais afrobrasileiros. O evento será às 19 horas, na Rua Luiz Campos Teixeira, 290 – Poço, Maceió. Sobre Mãe Mirian, escreveremos depois, pois a história de vida dela é monumental, e nestas linhas não cabe um resumo minimamente apresentável.
KLINGER DA SILVA, filho da Casa Posú Betá e Conselheiro Cultural da Aliança Francesa, afirmou que está em andamento um projeto de intercâmbio entre a Aliança Francesa, sob a coordenação do presidente da AF em Alagoas, George Sarmento, e lideranças dos cultos afrodescendentes, visando a formação intelectual de jovens, a troca de experiências, e oferecimento de cursos de francês com objetivo de ampliar e aproximar os horizontes locais à cultura dos povos africanos falantes da língua francesa, o idioma ocidental mais usado na África. Mais uma boa novidade.
NO DIA 8, além das celebrações públicas na orla de Pajuçara (e noutras praias de Alagoas), está anunciada, numa promoção da Prefeitura de Maceió, uma apresentação do grupo soteropolitano Afoxé Filhos de Gandhy, a partir das 14 horas, na praia de Pajuçara. Programação reforçada! Oxalá siga assim no porvir. Axé.

