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Dia de celebração religiosa afroalagoana no mar de Iemanjá

Por Enio Lins 05/12/2025

REPETINDO O TEMA, como sempre, nas proximidades do 8 de dezembro, insisto na importância particular da data para a cultura alagoana no geral e para a temática afrodescendente no particular. Desde que me entendo por gente – como se dizia no meu tempo de menino, e já se vão seis décadas nessa toada –, oito de dezembro é dia de festa no mar. É o momento em que a macumba, o xangô, ou denominações respeitosas outras, deixa seus terreiros e ganha as praias com muita gente em celebração. Em plenitude. É uma data-raiz de Alagoas, merecedora de ser oficializada como patrimônio imaterial.

É UM MOMENTO DO SAGRADO
, celebração religiosa de pura raiz afrobrasileira. Não é mera festa de rua, tipo carnaval fora de época. O tributo à Iemanjá tem o mesmo caráter devocional das procissões por Nossa Senhora da Conceição, referência católica para a mesma data, como sabemos. A diferença principal – além das teologias, etnologias, e considerações sobre classes sociais –, é que os cultos afrobrasileiros em Alagoas passaram por terríveis ondas de perseguições, dentre as quais se destaca o sinistro Quebra, cujo ápice se dá em 1912, e que marca profundamente o cenário afro religioso local com o abafamento dos terreiros. Isto resultou na ação defensiva do Xangô rezado baixo – uma semiclandestinidade, um escondimento visando a sobrevivência. Por mais de um século, a única manifestação pública, ampla, foi o 8 de dezembro.

HOJE
, sem ser mais a única, é o 8 de dezembro a maior e mais esfuziante das aparições públicas da religiosidade de matriz africana em Alagoas. Traz esse acontecimento, a cada ano – em sua exuberância de cores, tambores, danças, cortejos e oferendas –, a memória da resistência, da irresignação dos cultos afrobrasileiros frente à discriminação. Os poderes públicos, da mesma forma e com o mesmo cuidado com que apoia e aloca verbas em prol dos cultos cristãos, precisam apoiar e disponibilizar meios para que o Dia de Iemanjá se mantenha como momento soberano das religiões afrobrasileiras em nosso Estado.

SOSO DE YEMONJÁ,
liderança feminina na Casa Posú Betá, informa que, no domingo, dia 7, o terreiro da decana das mães de santo de Alagoas, Mãe Mirian (91 anos), comemora 75 anos de celebrações do 8 de dezembro: “Desde que, em 1950, o terreiro de Pai Edinho de Xangô, esposo (já falecido) de Mãe Mirian, no Corredor da Ponta da Terra (Rua Itambé), fez o primeiro presente público de Posú Betá para Yemonjá, não houve interrupção”. Soso complementa que, no evento dominical, o desembargador Tutmés Airan receberá o título honorífico de Obá de Xangô por sua trajetória de solidariedade ao povo de terreiro e de defesa dos valores culturais afrobrasileiros. O evento será às 19 horas, na Rua Luiz Campos Teixeira, 290 – Poço, Maceió. Sobre Mãe Mirian, escreveremos depois, pois a história de vida dela é monumental, e nestas linhas não cabe um resumo minimamente apresentável.

KLINGER DA SILVA,
filho da Casa Posú Betá e Conselheiro Cultural da Aliança Francesa, afirmou que está em andamento um projeto de intercâmbio entre a Aliança Francesa, sob a coordenação do presidente da AF em Alagoas, George Sarmento, e lideranças dos cultos afrodescendentes, visando a formação intelectual de jovens, a troca de experiências, e oferecimento de cursos de francês com objetivo de ampliar e aproximar os horizontes locais à cultura dos povos africanos falantes da língua francesa, o idioma ocidental mais usado na África. Mais uma boa novidade.

NO DIA 8
, além das celebrações públicas na orla de Pajuçara (e noutras praias de Alagoas), está anunciada, numa promoção da Prefeitura de Maceió, uma apresentação do grupo soteropolitano Afoxé Filhos de Gandhy, a partir das 14 horas, na praia de Pajuçara. Programação reforçada! Oxalá siga assim no porvir. Axé.

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