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A maior das chacinas cariocas segue o mesmo caminho das anteriores

Por Enio Lins 04/11/2025

MAIS DE 100 CIVIS E QUATRO MILITARES assassinados na chamada “megaoperação” no Rio de Janeiro é número suficiente para elevar a temperatura de qualquer debate sobre o tema. É justo discutir todos os detalhes dessa ação, uma chacina a mais. Mas o mais importante não é a questão da quantidade, nem mesmo a culpabilidade ou inocência de cada vítima. A pergunta capital é: serviu para que?

QUAL FACÇÃO CRIMINOSA
foi beneficiada? Pode apostar: no mesmo momento em que os corpos estavam sendo enfileirados num beco da favela, os becos da favela estavam sendo reocupados para dar sequência às mesmas atividades ilegais que foram usadas como justificativa para a megaoperação. Um grupo ganhou – e não foi a polícia, nem a justiça, nem a lei, muito menos a comunidade. A tragédia da insegurança pública carioca continua sendo a mesma, ou piorou, depois da sanguinolenta ação.

BENEFICIOU-SE O GOVERNADOR
, Cláudio Castro. Atraiu para si os aplausos de muitos eleitores que consideram a matança aleatória como o melhor dos métodos para combater a marginalidade (e não a criminalidade). Além disso, esse político rápido no gatilho mirou a rajada na Justiça Eleitoral, quando será julgado por um crime eleitoral de grande calibre, Castro é acusado de ter desviado cerca de R$ 220 milhões do erário para pagar cabos eleitorais em 2022. A megamatança foi deflagada no dia seguinte à definição da data de seu julgamento pelo TSE. Marcado para ser realizado hoje (terça, 4), pode lhe cassar o mandato e o deixar inelegível por oito anos. Assim, o estardalhaço sobre a chacina passou a ser instrumento midiático de heroificação do réu, pressionando o tribunal.

SE MATANÇAS ABALASSEM
o crime organizado, o Rio seria um oceano de paz, ordem, progresso e fraternidade. Só que não. Isso vale para qualquer lugar, mas o cenário carioca é tão emblemático que todos os olhares convergem para lá. Lembram-se da Chacina da Candelária, em 1993? Rapidinho se pode localizar arquivos fartamente documentados na Internet sobre, pelo menos, 50 carnificinas que espalharam sangue num intervalo de três décadas, desde a Chacina do Acari (1990) até dois morticínios seguidos na Vila Cruzeiro (fevereiro e maio de 2022).

LEMBRAM-SE DA
intervenção federal na Segurança Pública carioca, em 2018? A megaoperação militar foi comandada pelo general Braga Netto, e teve como seu resultado mais conhecido o assassinato da vereadora Marielle Franco, em 14 de março, a menos de um mês de controle do Exército sobre o Rio. Mas o fracasso no combate à criminalidade naquela ocupação é mais amplo. Segundo noticiado pela Agência Brasil, em 26/04/2018, “Nos dois meses de atuação da intervenção federal no Rio de Janeiro, o número de chacinas dobrou na comparação com o mesmo período de 2017. No ano passado, foram seis episódios que resultaram na morte de 22 pessoas. De 16 de fevereiro a 15 de abril de 2018, foram registadas 12 chacinas, com a morte de 52 pessoas”. Na contabilidade final, se constata nos 10 meses de intervenção, um “aumento recorde de 36,1% de mortes através de agentes do estado”, assinala a Wikipédia. Isso sem falar na corrupção militarizada durante o período. E o Rio seguiu padecendo dos mesmos problemas, como seguirá sofrendo após a chacina comandada por Cláudio Castro.

PUBLICADA N’O GLOBO,
em 03/08/2023, reportagem assinada por Rafael Galdo informa: “Desde 2018, mais de 7.800 pessoas morreram devido a intervenções de agentes do Estado no Rio. Até junho deste ano, números do Instituto de Segurança Pública mostraram que foram, em média, quase quatro vítimas por dia”. É uma política continuada de assassinatos, comandada pelos governantes cariocas e destinada a não ferir gravemente o crime organizado. Perguntem-se: quais facções têm se beneficiado dessas matanças para “limpeza de área” no Rio? Seriam as milícias?

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