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Stênio Reis e Edson Moreira: personagens emblemáticos das Alagoas

DUAS REFERÊNCIAS alagoanas encerraram suas existências de lutas e de contribuições para a sociedade. Um comunicador de grande sinergia com seu público, e um ativista da história das camadas mais sofridas da população. Morreram num espaço de tempo menor que uma semana, deixando vivas suas lições.
STÊNIO REIS foi radialista durante muitas décadas, num tempo em que a radiofonia era o canal mais forte de ligação entre profissional da comunicação e público, vínculo fundamentado na fidelidade, época na qual a interação se dava via telefone, carta, visita aos estúdios, encontros fortuitos no meio da rua – nada parecido com atual sinergia digital, impessoal, entre influencers e seguidores aos milhões de reações contabilizadas e monetizadas. Essa massificação atual, estabelecendo bolhas gigantescas, faz circular fortunas e cria celebridades milionárias do nada; entretanto, não consegue alcançar a intimidade e cumplicidade criada na era do rádio.
STÊNIO REIS fez parte dessa época de ouro da radiofonia, tempos em que ícones como Odete Pacheco, Edécio Lopes (só para citar dois exemplos) fundiam seus nomes com as denominações dos programas que apresentavam, como “Onde Canta o Sabiá” e “Manhãs Brasileiras”. Criavam vínculos fortes entre quem estava ao microfone e quem postava o ouvido ao autofalante, mais das vezes evoluindo para o contato pessoal, como bem lembrou (pelo telefone) Júlio Bandeira, relembrando a amizade entre seu pai Júlio Sousa (veterano da II Grande Guerra) e Stênio Reis, agenda que incluía conversas para atualizar e sugerir temas, na porta de casa do radialista – na Rua Manoel Lourenço, artéria do Bar do Pelado e do Boteco do Tonho, na Ponta Grossa. O brilho na radiofonia corresponde, ainda hoje, a um vínculo pessoal entre ouvinte e radialista mais forte que o estabelecido entre jornalistas de demais veículos e o público. “Fim de Papo”: A radiofonia aproxima mais que a televisão, que o impresso, e cria uma parceria mais humanizada (creio eu) que a estabelecida nas bolhas dos milhões das redes sociais.
EDSON MOREIRA dedicou à vida ao trabalho de valorização da cultura afrodescendente em Alagoas, numa militância tão intensa quanto distanciada das tradicionais correntes ideológicas e partidárias que marcam esse vasto e áspero campo de atuação. Não se esqueceu, em sua longa jornada, de valorizar as culturas originárias do Brasil, atendendo em suas todos os tons de pele com cores menos alvas. Trabalhou as maiorias marginalizadas, apoiou as expressões artísticas das camadas excluídas, num ativismo sempre polifônico, dando vazão a vozes nem sempre harmônicas, nem uníssonas – não ligava para divergências entre interpretações que considerava secundárias frente ao objetivo principal: valorizar e destacar a cultura não-elitista, oriunda das camadas mais populares pretas, pardas, cafuzas, indígenas...
EDSON MOREIRA foi um intelectual não-acadêmico, jamais se preocupou em formular teses, publicar estudos. Mas definiu tendências. Destaco aqui, dentre os rumos estabelecidos por ele: 1) A distinção da arte afrodescendente, com a valorização de artistas como José Zumba, a quem influenciou para um realce da temática negra em suas obras. No rico acervo do professor Edson se encontra a maior e melhor coleção de arte alagoana de matriz afro-brasileira. 2) O resgate de personagens fundamentais para a compreensão da resistência quilombola, como Ganga Zumba, e lideranças femininas como Dandara, Acotirene, Aqualtune (essas cujas histórias se mesclam com a mitologia palmarina), ombreando tais nomes o de Zumbi. De sua iniciativa nasceu a Praça Ganga Zumba, na praia de Cruz das Almas, e estátuas desse líder histórico – nem sempre lembrado – foram cravadas em Maceió e na Serra da Barriga.
VIVA STÊNIO TORRES! VIVA EDSON MOREIRA!