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Um político de centro, cujo centro da política era a educação

TARCÍSIO DE JESUS foi homenageado, no domingo, 24, com a aposição de uma estátua em sua cidade natal, Junqueiro. Véspera da data de seu nascimento, ocorrido em 1923, no Engenho Cambuí, perto da atual área urbana municipal. Deputado por seis mandatos, a partir de 1958, notabilizou-se por suas realizações no campo da educação, no sentido inverso da maioria dos políticos ligados a um determinado setor: ao invés de usar as escolas para ajudar a se eleger, usava o mandato para ajudar às escolas.
ERA O COLÉGIO ÉLIO LEMOS, fundado por ele, seu principal foco. Estudei ali o ginasial, entre 1968 e 1971, e de lá só tenho boas recordações. Localizada no bairro da Ponta Grossa, a edificação distanciava-se da Lagoa Mundaú por uma extensa várzea que cumpria o papel se segurar as águas quando das cheias periódicas, acomodando-as enquanto decantavam. Nos verões, o solo escuro, lodoso, seguia úmido e uma parte do terreno era convertido em área para futebol. Era o “campo do caco de vidro”, pois ali se depositavam coisas cortantes a cada enchente, latanhando os pés dos atletas. A direção do colégio fazia de tudo para impedir as peladas no lugar. Em vão.
NAQUELE TEMPO, eu morava na área rural de Maceió, em Mangabeiras. Uma placa colocada nas imediações de onde hoje está a Carajás, apontava na direção do centro da cidade, e avisava: “Área Urbana”. Até o final dos anos 1950, a atual Avenida Gustavo Paiva era uma estrada de barro, e os resquícios dos trilhos do bonde lembravam que o final da linha era na “Corrente”, o posto fiscal, situado mais ou menos na altura da atual Igreja Universal. Por volta de 1962, o “Major Luiz”, governador do Estado, acompanhou pessoalmente as obras de alargamento e asfaltamento da pista, no rumo de Paripueira. Aos 11 anos, em 1968, quando chegou minha hora do ginasial, estava apto a vencer sozinho o trajeto num dos velhos ônibus da linha Cruz das Almas – Vergel do Lago. Via Poço.
TESTEMUNHEI, no Élio Lemos, o zelo do professor Tarcísio de Jesus como educador. Em sendo deputado, delegou o gerenciamento da escola para jovens administradores como o advogado Diógenes Tenório (intelectual de porte, vindo de Murici), Benedito de Lira (gestor habilidoso, conterrâneo dele, de Junqueiro) e outros notáveis. Professores da mais alta qualidade, como Pedro Teixeira, Carlos Méro, José Maria Tenório, Elinaldo Barros, Gilberto Torres, Maria Carrascosa, e não me lembro - lamentavelmente - do nome de uma espetacular professora de português que usava “Vidas Secas” como referência para literatura e gramática. Tarcísio de Jesus ia todos os dias ao colégio, inspecionava pessoalmente o andar da carruagem, reunia-se com os gestores, percorria os corredores, vitoriava as salas de aula. Nós o cumprimentávamos como “professor” e não como “deputado”. Era um político de centro, discreto, sem extremismos. E jamais ouvi de meus pais, ou de algum colega sobre os pais deles, alguma referência de que ele tenha cobrado votos nalgum momento. Naturalmente, o voto era bem-vindo, mas ele não pedia, nem exercia nenhum controle sobre em quem teria votado os parentes dos alunos. E, detalhe não secundário para mim: foi no Élio Lemos que tive os primeiros professores de esquerda, destemidos no enfrentamento do terrorismo do AI-5.
RITA CORREIA, filha única, médica, ex-aluna do Élio Lemos, foi vereadora em Maceió, honrando a herança política paterna por mais de um mandato. Abriu mão dessa missão algum tempo depois da morte do pai, ocorrida em 1990. Segue na vertente educadora, sendo a principal cuidadora da memória de Tarcísio de Jesus. À amiga Rita, em nome de toda família oriunda do Cambuí, como tributário do professor Tarcísio, envio meus aplausos para esse trabalho – familiar, político e educativo – de preservação da história.